Citações

CONHECE A TI MESMO

"Em primeiro lugar, cada um tem as suas capacidades, os seus recursos, as suas dificuldades interiores ou exteriores, e devemos perguntar se é prudente cultivar igualmente aquilo para que somos feitos e aquilo que mais ou menos está fora do nosso alcance. Vencer uma dificuldade é bom; é preciso; mas a vida intelectual não deve ser acrobacia permanente. É muito importante trabalhar com alegria, portanto com facilidade relativa, portanto com o sentido das aptidões. É preciso, avançando primeiramente em diversas vias, descobrir-se a si próprio, e, uma vez ciente de sua vocação especial fixar-se nela. Em seguida, há um perigo que espreita os espíritos que se espalham demasiado: o contentar-se com pouco. Satisfeitos com as suas explorações através de tudo, cessam o esforço; os progressos, primeiro rápidos, são como fogos-fátuos. Nenhuma energia se desdobra muito tempo senão for estimulada pela dificuldade crescente e sustida pelo interesse, também crescente, duma investigação laboriosa. Examinando o conjunto, julgado nas suas relações e unidade, à luz dos princípios fundamentais, é urgente, se se não quer patinhar do mesmo sítio, lançar-se a uma tarefa precisa, limitada, proporcionada às próprias forças e aplicar-se a ela de alma e coração."
A. D. Sertillanges, filósofo e teólogo francês
A Vida Intelectual: Seu Espírito, Suas Condições, Seus Métodos
"Parece que o primeiro conselho a dar a quem trabalha é o de antes de tudo penetrar no conhecimento de si próprio, tal exercício não consiste em apertar a cabeça entre as mãos e mergulhar no abismo interior onde nada se vê, mas sim, em fazer passar pela memória aquilo que se fez no decurso da última semana, em enumerar as horas em que efetivamente se trabalhou, em tomar consciência do que se perdeu e do que se ganhou. Um tal balanço das nossas forças é bem necessário porque as ideias mais tolas são as mais difundidas, e os programas de ensino fazem crer que o nosso saber pode ser enciclopédico."
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
“Cada eixo de pensamento é uma promessa e uma esperança, porque nos torna merecedores do acaso. Os acasos são inumeráveis. Todas as vezes que se cruzam duas séries independentes, há, diz-se, acaso. Se aceitarmos essa definição, perceberemos que o acaso é constante, porque somos nós mesmos uma dessas séries e o mundo é uma outra. A nossa vida interior desenrola-se sem referência ao universo. Os que nos falam não conhecem os nossos desejos, o nosso passado, nem a maneira pela qual esse passado vem à superfície; eles ignoram tudo o que nos constitui. E, contudo, acontece que um gesto, uma palavra, um acontecimento tomam, nessa discussão interior, um significado que só a nós diz respeito.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem

VIDA INTELECTUAL

“O que interessa é que tu permaneças acima do teu trabalho e que ele te sirva para a tua formação. Por isso, penso que há apenas um conselho a dar-te, sempre incompreendido ou travestido, e que vale até o fim: ‘Procura a verdade. Diz apenas o que julgas saber, cala-te a respeito de tudo o mais. Exprime-te com sinceridade e recusa as construções com floreios. Se acontecer que, uma vez encontrada a verdade, tenhas de comunicá-la, fá-lo-á da maneira mais conforme à tua verdade interior.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
"O trabalho intelectual exige duas qualidades contrárias: a luta contra a dispersão - o que só é possível concentrando-se - mas também um certo desprendimento em relação a esse trabalho, pois o espírito deve alcançar a sua altura, deve ser mantido - como dizia Étienne Pascal - acima da sua obra."
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
“Sendo moderados nas conversas, permanecereis recolhidos e lograreis a sabedoria indispensável para o intercâmbio das ideias com o próximo. Falar para dizer o que se deve dizer, para exprimir um sentimento oportuno ou uma ideia fútil depois disso calar-se, eis o segredo de o intelectual se guardar ao mesmo tempo que se comunica. Não existe outro meio de dar autoridade à palavra. A palavra pesa, quando por debaixo dela se pressente o silêncio, quando esconde e deixa adivinhar, por trás dos sons, um tesouro que vai dispensando com medida sem pressa nem agitação. O silêncio é o conteúdo secreto das palavras importantes. O valor duma alma mede-se pela riqueza do que ela não diz.”
A. D. Sertillanges, filósofo e teólogo francês
A Vida Intelectual: Seu Espírito, Suas Condições, Seus Métodos
“Calarmo-nos, desde que não se tenha nada a dizer que valha a pena. Esse preceito abrange a criança e o velho. O silêncio daquele que se abstém de falar é um silêncio instrutivo e sonoro.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
“O mais belo no trabalho intelectual (e mesmo na escola, tão carregada de convenções) é que o trabalho do espírito é o espelho e o prelúdio daquilo que será mais tarde largamente prodigalizado na vida. O aluno que tenta e que desespera, o que fracassa depois de ter procurado longamente, o que é incompreendido pelo professor ou que não o compreende, tudo isso ensina a existência, ainda mais que o cálculo ou a gramática. Ocorre o mesmo, e sobretudo, com o estudante solitário, sem obrigações fixas nem ajudas frequentes, que é obrigado a disciplinar-se a si mesmo. É raro ver os pedagogos insistirem nessa semelhança entre a escola e a existência, que no entanto é para mim o segredo fundamental de toda a pedagogia - para que serviria estudar se o estudo não nos preparasse para as leis cheias de exceções, para as alegrias sombreadas pelas tristezas, para os acasos que aparecem como constelações enigmáticas, sobre as quais é preciso que haja um certo domínio? Muitas vezes a matéria dos nossos estudos é fútil - a que benefício pode servir, diz-se, fazer um exercício de latim, posto que não se falará nunca o latim? Raciocínio que se poderia estender a quase tudo nos pormenores de nosso trabalho. Só se pode vencer esse estado de espírito atribuindo um valor absoluto ao ato da atenção, à perfeição formal, ao esforço de um dia; digo-o pensando que todo ato de atenção, de resistência, toda busca pela perfeição minúscula, externa toda a recompensa e a todo resultado, encontra em si mesmo sua recompensa. Uma alma poética ora me compreenderá.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
“Quanto mais se progride, mais os desgostos do trabalho tornam-se íntimos; de resto, é a lei do sofrimento, quando ele dura - ao desenvolver-se, tudo se interioriza. Certamente que o pensamento de concurso subsiste obscuramente e sob sua forma mais insidiosa, que é a competição consigo próprio, o desespero de ser o seu próprio rival. A isso juntam-se ainda as dificuldades do trabalho intelectual solitário: a sua monotonia, os seus nós, a sua morosidade; a experiência da exata verdade ou da exata expressão tão raramente atingida; o sofrimento da alma por ver triunfar os falsos valores e ver desconhecidos os autênticos; a dificuldade de ter autoridade sobre seu próprio espírito; as próprias escolhas que nos são cada vez menos impostas pelos outros ou pelas circunstâncias e que cumpre encontrar em si mesmo. Acrescento ainda o sentimento que há no Eclesiastes e na Imitação da vaidade de tudo o que é escrito (fora do domínio das constatações), a crescente precariedade do mundo que nos envolve e onde nos lançamos, e, ainda, a lei que obriga a que a maior parte das sementes se perca e que apenas germine a mais improvável.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
"Pergunta Amiel em seu diário: 'Por que és fraco? - Porque cedeste dez mil vezes, convertendo-se em joguete das circunstâncias. Foste tu que as fizeste fortes, não elas que te fizeram fraco'."
A. D. Sertillanges, filósofo e teólogo francês
A Vida Intelectual: Seu Espírito, Suas Condições, Seus Métodos
"Os leitores acharão muito naturais os vossos êxitos, criticarão duramente os vossos desfalecimentos; não suspeitarão quanto trabalhardes. Nem é preciso, 'as obras realizadas à custa de grande trabalho'; dizia Miguel Angelo, 'devem dar impressão de terem sido fáceis de conceber e executar... A grande regra consiste em esforçar-se muito para criar coisas que parecem não terem custado nada'. Por sua vez, Boileau gabava-se de ter aprendido, em Racine, a arte de compor dificilmente versos fáceis. Em matéria de ciência, dizia Biot: 'nada é tão simples como o que se descobriu ontem, nem tão difícil como o que se há-de encontrar amanhã'. São segredos que o público não suspeita. Carregueis a vossa carga sozinho, e os homens superiores avisam-vos que o pensamento é a mais pesada carga que o homem pode levar."
A. D. Sertillanges, filósofo e teólogo francês
A Vida Intelectual: Seu Espírito, Suas Condições, Seus Métodos

DO LOCAL DE TRABALHO

“Creio que o primeiro cuidado a se ter deve ser o de encontrar o refúgio, um recanto, e isso pode-se fazer até na prisão. Organizar a gruta; escolher um lugar tal que tudo nele seja paz e incentivo. Se esse apartamento estiver organizado com luxo, que esse luxo seja sóbrio. Se estiver organizado pobremente, que essa pobreza esteja cheia de símbolos. ‘Não tolere nada junto de si’, dizia Ruskin, ‘que não lhe seja útil ou que você não ache belo’. Essa regra aplicada num quarto de trabalho leva a várias condenações.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem

COMEÇAR É METADE DO CAMINHO

"Dimidium facti qui coepit habet: sapere aude (Aquele que começou está na metade da obra: ouse saber)."
Horácio, poeta e filósofo romano.
Epistularum liber primus
"Em todas as coisas, é preciso começar: 'o começo é mais da metade duma coisa', disse Aristóteles. Quem não produz, habitua-se à passividade; o medo de orgulho - porque o orgulho também gera medo - ou a timidez aumentam mais e mais; recuamos, cansamo-nos de esperar, tornamo-nos improdutivos."
A. D. Sertillanges, filósofo e teólogo francês
A Vida Intelectual: Seu Espírito, Suas Condições, Seus Métodos

METODOLOGIA

“Nunca será demais repetir esta bela regra natural: ir, em tudo, do conhecido para o desconhecido.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
“A doutrina do parágrafo, quando bem compreendida, proporciona a maneira de escrever bem, de expor bem, assim como a de ler bem e obter proveito prolongado das nossas leituras, por meio de anotações duradouras. E o maior serviço que se pode prestar a um jovem é ensinar-lhe esse método, como fazia Bézard durante a primeira e a segunda séries. Funda-se essa doutrina num princípio claro e preciso, mas que depressa esquecemos no ato de expor: o caráter limitado e oscilante de toda atenção. A embocadura da atenção é exígua: cumpre verter o elixir gota a gota. O espírito é dispersivo; a atenção faz lembrar um farol, que brilha por uns momentos, depois se extingue e volta a brilhar. É possível que ela se relacione, no seu exercício, com o movimento da respiração, que vai e vem. Para nos fazermos compreender é necessário, pois, decompor tanto quanto possível: dizer apenas uma coisa de cada vez. Mais ainda: é preciso repetir. Um professor de línguas dizia-me que considerava um vocábulo verdadeiramente conhecido pelos seus alunos só quando estes o tinham esquecido e reaprendido nove vezes. Em todos os casos, para exprimir um pensamento é necessário depurá-lo, discernindo quer os aspectos que o objeto desse pensamento comporta, quer os princípios que lhe são implícitos e que um tal pensamento pressupõe. Tais aspectos e tais princípios, uma vez conhecidos, precisamos expô-los um a um. Imaginar alguém que costura, enquanto se trabalha, é bom: fará melhor lembrar que tudo, no trabalho e na vida, faz-se ponto a ponto, para citar aqui a frase de Madame Valmore, que Sainte-Beuve reporta."
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
“Assim, o trabalho que se deve aconselhar à juventude não consiste só em recolher ideias ou informações, e amontoar frases sobre frases, mas, ao contrário, em escolher uma ideia e desdobrá-la, como um tecido, completamente. Era esse trabalho que outrora ensinava a retórica. E sem dúvida imiscuía-se nela muita pedantaria e obscuridade. Estaria ela, no fundo, desprovida de razão? A nova retórica dever-se-ia purificar do inútil, como Descartes purificou a lógica e a álgebra, reduzindo-as a alguns princípios. Tinha Descartes razão em dizer que o excesso de regras é uma desculpa para a preguiça. O espírito, sempre ardiloso e pronto para encontrar uma desculpa, adota métodos rigorosos e resoluções heroicas com o fim de se dispersar de observá-las, dizendo consigo: ‘Essas regras são demasiado intensas para mim e verdadeiramente impraticáveis’. O difícil na vida, se queremos fazer nela algum progresso, é se decidir por uma prática simples que seja de aplicação quotidiana, e depois permanecer nela durante meses . Era segundo esse ponto de vista que eu procurava por um exercício fácil o bastante e rico em consequências, ao qual poderíamos, talvez, reduzir a retórica.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem

ORGANIZAÇÃO DO TEMPO, CONSTÂNCIA E CONSISTÊNCIA

“Deveríamos nos esforçar em descobrir quais são as horas divinas, aquelas nas quais a atenção está num estado de lucidez, de penetração, de coincidência com o eu mais vivo. Determinar as horas de paz ativa, o seu número, a sua duração, o seu ritmo, o seu regresso, depois fazer girar o nosso trabalho ao redor delas. Nunca permitir que nessas horas nos deixássemos prender pelas ninharias deste mundo. Revolucionar o nosso horário (levantando-nos às seis horas ou, pelo contrário, deitando-nos à meia noite), a fim de fazer girar o nosso trabalho ao redor das horas sagradas, e nunca essas horas ao redor de nosso trabalho. Isso é que seria acertado: dispormos de nosso tempo, o que – ai de nós! – é tão raro. Mas o espírito desse programa pode ser conservado totalmente. E deve-se, para evitar o excesso de atividade, determinar quais são as horas de frescor, ocupá-las no que é mais urgente, ou no mais pesado, ou no que é mais santamente agradável – pôr nelas esse dom do homem que se chama ‘o que lhe é possível’... e deixar o resto a Deus, para que o complete.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
"Isso implica também que se distinguam nitidamente as fases do repouso, da preparação e da execução. Nunca se deveria deixar que essas fases se misturassem; não se deveria ficar satisfeito com esse vago trabalho que não é nem paz nem a aplicação. e com o qual contentam-se tanto os alunos como os burocratas."
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
“Creio que uma das leis do bom artesão é saber em tudo separar as fases. Já fiz referência à vantagem que há em não misturar o repouso com a aplicação, mistura que vai ter como resultado essa espécie bastarda de semi-trabalho, que faz com que, passando muito mais horas nas escrivaninhas, não obtenhamos os mesmos resultados que o fleumático anglo-saxão. E é um bom conselho aquele de dividir tanto quanto se possa o trabalho intelectual em três tempos; o da confecção do ‘monstro’, o do repouso dirigido, o do acabamento na busca da perfeição.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
"A regra de ouro do trabalho intelectual pode traduzir-se assim: Não tolere nem o semi-trabalho nem o semi-repouso. Doe-se por inteiro ou descanse absolutamente. Que não haja nunca em você mistura de gêneros!"
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
"Fazei alguma coisa ou não façais nada. Executai ardentemente o que decidis fazer, com afinco, de sorte que a atividade seja uma série de atos continuados com tenacidade. O trabalho a meias, que é repouso a meias, não favorece o estudo nem o descanso."
A. D. Sertillanges, filósofo e teólogo francês
A Vida Intelectual: Seu Espírito, Suas Condições, Seus Métodos
"Chamai então a inspiração. A deusa nem sempre acudirá, mas sempre se deixa comover pelos esforços sinceros. Não quero com isto dizer que vos estafeis, mas sim que vos orienteis, que viseis ao alvo e afasteis do campo visual, como o atirador, tudo o que não for o ponto de mira."
A. D. Sertillanges, filósofo e teólogo francês
A Vida Intelectual: Seu Espírito, Suas Condições, Seus Métodos
"A constância vence ainda as impressões de falso cansaço que se apoderem do espírito e do corpo. Quem faz alpinismo sente-se muito frequentemente esbaforido e pesado ao fim de algum tempo; o busto curva-se para adiante; de bom grado arrepiaria caminho. Ora persisti: as articulações desenferrujam-se, os músculos treinam-se, a respiração dilata-se e começa-se a experimentar a alegria da ação. O mesmo acontece com o estudo. Longe de ceder à primeira impressão de fadiga, rompei para frente, forçai a energia interior a sair. Pouco a pouco as rodas entram a funcionar, adaptamo-nos, e a inércia dolorosa pode suceder um período de entusiasmo."
A. D. Sertillanges, filósofo e teólogo francês
A Vida Intelectual: Seu Espírito, Suas Condições, Seus Métodos
“E dizia Simone Weil: A atenção é um esforço, o maior dos esforços talvez, mas é um esforço negativo. Por sua natureza não comporta a fadiga. Quando o cansaço se faz sentir, a atenção quase não é possível, a menos que se esteja já bastante habituado. Então, o melhor é descansar, procurar um escape, para depois, um pouco mais tarde, recomeçar – descontrairmo-nos e contrairmo-nos, como se inspira e se expira.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
“Todo trabalho obriga à concentração do pensamento sobre um só ponto. Mas esse ponto não é necessariamente o ponto principal. E se o fosse, por uma feliz coincidência, nós nos afastaríamos dele depressa. Cada golpe de enxada afasta-nos do centro, ensurdece-nos, cobre-nos de escombros, de destroços e de poeira. Do mesmo modo, cada ato de atenção fremente contrai-nos: exige de nós um esquecimento momentâneo de tudo o que não é urgente e imediato; crispa-nos; perturba um equilíbrio. Certamente não devemos desprezar os espíritos atentos, mesmo se o objetivo de sua atenção for reduzido. Toda precisão é vitória. Mas é necessário lembrarmo-nos de que toda atenção particular comporta um risco, se não for acompanhada de uma atenção geral, e este último ato é vizinho ao repouso, porque exige um descanso da inteligência e até mesmo da vontade.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem

RETENÇÃO E MEMÓRIA

"Se quereis reter, atendei às ligações e às razões das coisas; analisai, procurai os porquês, observai a genealogia dos acontecimentos, as sucessões e dependências, imitai a ordem matemática, onde a necessidade, partindo do axioma, chega às mais longínquas conclusões. Compreender a fundo, aprender em seguida a introduzir no espírito, não anéis a esmo, mas uma corrente, é assegurar a coesão do todo. A união faz a força."
A. D. Sertillanges, filósofo e teólogo francês
A Vida Intelectual: Seu Espírito, Suas Condições, Seus Métodos
"Em resumo, o que importa à memória não é tanto o número das aquisições, quanto, primeiramente a sua qualidade, em seguida a sua ordem e finalmente a habilidade do seu emprego. Os materiais não faltam ao pensamento, é o pensamento que falta aos materiais. Aprender não é nada, sem a assimilação da inteligência, sem a penetração, sem o encadeamento, sem a progressiva unidade duma alma rica e regulada."
A. D. Sertillanges, filósofo e teólogo francês
A Vida Intelectual: Seu Espírito, Suas Condições, Seus Métodos

PREOCUPAÇÃO COM A PERFEIÇÃO

“Assentemos logo de início que não existe uma ordem perfeita: a toda e qualquer disposição das matérias poder-se-ia preferir uma outra e justificá-la com motivos razoáveis. Trata-se, apenas, de não nos deixarmos perturbar pela ideia da perfeição e de elevar a um grau maior de nitidez o plano que se apresenta ao nosso espírito. Para isso, releia as suas notas, discernindo as que se referem ao mesmo assunto. O pensamento é musical, supõe temas que perdem e se retomam.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
“Mas existe uma diferença infinita entre o pior dos rascunhos e a ideia pura inexpressa. Esse monstro será para nós uma argila original. Não se avalia suficientemente a vantagem de ter uma primeira matéria resistente à qual nos podemos aplicar. Porque é mais fácil corrigir, rasurar, retomar, do que fazer, inventar, criar. A frase mais insignificante vale mais que o papel branco. Balzac conhecia essa lei. Esperar pela inspiração é uma operação vã. O dever consiste em pegar na matéria e sujar as mãos.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
“Se os capítulos precedentes têm um sentido, ele é, como já te disse, o de confortá-lo. Duvidas de ti. Não tens razão nisso. Poderás fazer o que quiseres, se o desejares realmente e com tenacidade. Na tua idade, a expressão dez anos assusta. Pois eu te digo que dez anos não são nada. Repara no que aprendeste dos dez aos quinze anos; faz o cálculo do que poderias ainda aprender se tu quisesses, ou se para isso fosses compelido, como se faz ao rapazinho da escola. A perfeição não está longe de ti. Quanto tempo se perde a procurar o melhor livro, o melhor método, o melhor amigo! Um velho professor respondeu um dia a um aluno que lhe perguntava qual era o melhor manual: ‘Meu amigo, é esse que você tem’. E poderia acrescentar-se que o melhor momento é este, que este é o melhor ambiente, que o melhor pensamento é este que neste momento te acode. Não procure, portanto, o melhor. Mas àquilo que neste momento está entre as tuas mãos, ao que fazer presentemente, imprime, com a aplicação do espírito, essa dignidade de ser o melhor. Não deixes para amanhã o que podes fazer hoje; mas, ao mesmo tempo, não deixes remeter para amanhã tudo o que não pode entrar na estreita capacidade do presente. O que equivale a dizer: ‘ocupa com algo pequeno a ponta de tempo que passa e repele para o infinito o teu desejo’. Aceita todos os teus limites. O limite dá a forma, que é uma condição da plenitude.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem

SOBRE A PRESSA E A AUSÊNCIA DE RESULTADOS APARENTES

“É mesmo notável que o sucesso imediato é um mau sinal; a obra que obtém repentinamente o seu significado corre o risco de esgotar nesse presente furtivo a possibilidade de alcançar outros sentidos.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
“Se com uma verdadeira atenção procura-se a solução de um problema de geometria, e se ao fim de uma hora não se avançou nada em relação ao começo, ter-se-á, contudo, avançado durante cada minuto dessa hora numa outra dimensão mais misteriosa. Sem que se sinta, sem que se saiba, esse esforço, aparentemente estéril e sem frutos, lançou mais luz na alma. O fruto será encontrado um dia, mais tarde, na prece. Sem dúvida, também será reencontrado, por acréscimo, num domínio qualquer da inteligência, talvez de todo estranho à matemática [...]. Um conto esquimó explica assim a origem da luz: ‘Um corvo que, na noite eterna, não podia encontrar o alimento desejou a luz e a terra iluminou-se’. Se existe verdadeiramente o desejo, se o objeto é verdadeiramente a luz, o desejo da luz produzirá a luz [...]. Os esforços inúteis do cura d’Ars, durante os longos e dolorosos anos em que aprendeu latim, deram o seu fruto em sua maravilhosa faculdade de discernimento, com a qual ele percebia a própria alma dos penitentes por detrás de suas palavras ou mesmo de seus silêncios.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem
"Eis o modo como a ocupação militar é uma imagem do trabalho intelectual: o segredo, em ambos os casos, está, creio eu, em obrigar-se a certas aplicações bastante exatas, mas deixando aberta ampla margem; em entregar-se a direções nítidas, mas contas com o acaso; em não saber nunca onde se chegará, mas estar certo, todavia, de que lá chegará."
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
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"'Ingressum instruas/Progressum custodias/Egressum impleas'. Essa prece de S. Tomás poder-se-ia traduzir assim: 'Vela pela preparação, vigia os progressos, recolhe os frutos'. Ela nos indica o ritmo deste pequeno livro, cujo objetivo é o de fazer com que nos deixemos transportar pelo ritmo do espírito humano no que toca ao esforço intelectual. Afigura-se-nos que esse movimento é o de uma onda que se prepara, sobe, cresce e rebenta por fim, deixando traços na areia."
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem

DO TEMOR DOS DESAFIOS E DAS DIFICULDADES

“Chega um momento em que o esforço aplicado a um obstáculo exterior suscita um obstáculo interior mais insidioso que o outro, que cresce sem parar, muito mais ainda quando se tenta resisti-lo, como se vê com o gago. Os moralistas, que estudaram o mecanismo da tentação, sabem-no bem. Ser tentado é estar às voltas com uma imagem que pressentimos que agirá sobre as nossas glândulas. É evidente que uma certa maneira de orientar o esforço para dissipar a imagem corre o risco de intensificá-la. O corpo não conhece a diferença entre o sim e o não. Dizer: ‘Não tenho medo, não quero ter medo desse projétil que passa’ é aumentar imagens que nos são adversas. Não querer tremer nos momentos de medo aumenta o estremecimento. Enrijecer para não ceder à tentação é dispor-se a ceder ainda mais depressa. É por isso que se pede a Deus para não ser tentado, e não para resistir, ato muito difícil. O velho Coué dizia em sua linguagem, geométrica demais para meu gosto, que ‘quando há uma luta entre a imaginação e a vontade, a imaginação aumenta ao quadrado da vontade’.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem

SOBRE AS QUEDAS E FALHAS

“O leitor me desculpará por propor-lhe a folha que dito aos aprendizes no início do ano - não exatamente no início: para que uma lição seja proveitosa, é necessário que o aprendiz tome consciência de sua mediocridade por meio de fracassos bem sentidos; não é senão depois de três quedas que se tem direito a uma lição construtiva.”
Jean Guitton, filósofo e escritor francês
O Trabalho Intelectual: Conselhos Para os que Estudam e Para os que Escrevem

CONTATOS